Em 2007, cientistas norte-americanos iniciaram a mais ambiciosa
pesquisa sobre meditação já feita. Eles colocaram anúncios em revistas budistas
para recrutar voluntários dispostos a passar três meses num retiro espiritual
intenso. Quem topou a parada foi enviado ao Centro Shambhala, situado no topo das montanhas do Estado do
Colorado, EUA, num lugar feito para a contemplação. Quem os orientava era Alan
Wallace, que viveu 14 anos como um monge budista tibetano. As técnicas de
meditação ensinadas por Wallace focavam em três princípios: acalmar o corpo,
organizar a mente e iluminar a consciência. Além disso, os participantes eram
encorajados a cultivar valores como bondade, empatia, sensatez e compaixão.
As sessões de meditação nas montanhas coloradas duravam de
cinco a dez horas por dia. Durante três dias corridos, os participantes faziam
meditações focadas na respiração e sensações. Depois, mudavam a técnica para adquirir"
consciência da consciência" , e assim por diante. As práticas só eram interrompidas
para que os participantes pudessem ser entrevistados pelos pesquisadores e
respondessem questionários diários, nos quais apontavam o tempo e o tipo de
meditação, o humor, as sensações, os insights e os sonhos que tinham.
Durante o retiro, as cabeças quase totalmente raspadas dos
budistas das mais variadas origens receberam centenas de eletrodos para avaliar
as mudanças cerebrais.
Os cientistas da Universidade da Califórnia queriam responder
a perguntas como: é verdade que a meditação aprimora também a capacidade da
pessoa de lidar com emoções ruins? E que ela se torna mais resiliente a situações
de stress e mais afável às relações com os outros? Essas mudanças persistem depois
que os voluntários saem do retiro e voltam à agitada vida moderna?
A hipótese dos investigadores era a de que os três meses de
treinamento iriam melhorar o desempenho cerebral em geral. As medidas foram
tiradas no início, no meio e ao final do período do estudo. A maior parte dos
testes media habilidades cognitivas. Mas os participantes fizeram também uma
série de exames de sangue. Foram avaliados hormônios e biomarcadores associados
ao sistema imune para entender afinal qual é a relação entre as mudanças neuronais,
cognitivas e a biologia. Foi aí que o Projeto Samatha, como foi batizado, revelou
algo inédito. A psicóloga Elissa Epel, psiquiatra da Universidade da Califórnia
de São Francisco, descobriu que a meditação alterava os cromossomos,
especificamente nos telômeros, estruturas formadas por fileiras repetitivas de
proteínas e DNA.
Os telômeros funcionam como uma espécie de cronômetro
regressivo do sistema imune.
Cada vez que uma célula se divide, seus telômeros
diminuem de tamanho ao mesmo tempo que uma enzima, chamada telomerase, reconstrói
as estruturas. Quando os telômeros ficam muito pequenos, a
célula perde sua capacidade de se multiplicar e morre. Pessoas com telôrneros
curtos têm mais chances de ter um infarto, sofrer de diabetes, ser obeso, ter
depressão e desenvolver doenças degenerativas como a artrite e a osteoporose.
Em consequência, morrem mais cedo - até dez anos antes.
Em 2009, os pesquisadores Elizabeth Blaék- burn, Jaék Szostak e Carol Greider,
responsáveis por descobrir a relação entre os telômeros e o envelhecimento celular,
ganharam. o Prêmio Nobel em Fisiologia.
DURANTE TRÊS MESES, MEDITADORES EXPERIENTES,
REUNIDOS NAS MONTANHAS DO COLORADO, EUA, TIVERAM
SEU CÉREBR'O E ORGANISMO AVALIADOS. OS RESULTADOS DO
EXPERIMENTO MOSTRAM QUE A PRÁTICA MILENAR PRESERVA
OS TELÔMEROS, ESTRUTURAS ASSOCIADAS À LONGEVIDADE
Ao final do
retiro de três meses, Elissa Epel analisou os cromossomos dos participantes.
Assim, descobriu que os meditadores estavam com a atividade da telomerase muito
mais ativa na comparação com os voluntários que não me- ditaram. O resultado
indicou que seus telômeros ficaram melhor protegidos no período. Em teoria,
isso poderia diminuir ou reverter o envelhecimento celular.
O estudo foi o
primeiro a sugerir que a meditação pode ter um papel-chave em prolongar nossos
anos de vida na Terra. A prática rnilenar faz isso justamente porque nos ajuda
a lidar com situações de ansiedade (leia mais nas págs. 26 e 27). A própria Elissa
descobriu, em outro experimento, que o stress está associado a telôrneros mais
curtos nos leucócitos e uma atividade menor da telomerase.
Os estudos de
Elissa foram pioneiros. Mas, em 2013, Elizabeth Hoge, da Escola de Medicina de
Harvard, trouxe mais uma evidência do impaéto da meditação sobre o DNA celular.
Ela descobriu que quem praticava a meditação da compaixão tinha também
telômeros mais longos em comparação com quem não meditava. Uma sessão intensa
da prática em um único dia já seria capaz de mudar a forma como os nossos genes
se expressam – ou seja, como produzem substâncias boas ou ruins para o
organismo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário