Oi gente!
Dando continuidade na matéria sobre O QUE É A MENTE retirado do blog
https://budismopetropolis.wordpress.com/2015/07/21/o-que-e-a-mente/
vamos abordar hoje a diferença entre ilusão (maya) e o estado iluminado do ser.
COMO DIZ UM ANTIGO CONTO ZEN:
"O monge perguntou ao Mestre:
“Como posso sair do Samsara (a Roda de renascimentos e mortes)?”
O Mestre respondeu:
“Quem te colocou nele?“
Vamos refletir sobre isso durante a semana, ok?
Beijos no coração
Namastê
ॐ
A verdadeira experiência da natureza essencial da mente está
além das palavras. Querer descrevê-la é como a situação de um mudo que quer
descrever o sabor de um doce em sua boca: ele não tem um meio adequado de se
exprimir. Mesmo assim, gostaria de oferecer algumas ideias que ajudem a esta
experiência.
Podemos pensar que a natureza da mente pura tem três
aspectos essenciais, complementares e simultâneos: a abertura, a claridade e a
sensitividade.
A abertura
A mente é o que pensa, “Eu sou”, “Eu quero”, “Eu não quero”;
é o pensador, o observador, o sujeito de todas as experiências. Eu sou a mente.
De um ponto de vista, esta mente existe, já que eu sou e eu tenho a capacidade
de ação. Se eu quero ver, eu posso ver; se eu quero ouvir, eu posso ouvir; se
eu decido fazer algo com minhas mãos, eu posso comandar meu corpo, e assim por
diante. Neste sentido, a mente e suas faculdades parecem existir.
Mas se buscarmos por ela, não podemos encontrar qualquer
parte dela em nós, nem em nossa cabeça, em nosso corpo ou em qualquer outro
lugar. Então, desta outra perspectiva, ela parece não existir. Portanto, de
outro lado a mente parece existir, mas por outro lado não é algo que
verdadeiramente existe.
Por mais exaustivas que sejam nossas investigações, nunca
seremos capazes de encontrar quaisquer características formais da mente: não
tem dimensão, nem cor, forma ou qualquer qualidade tangível. É neste sentido
que ela é chamada de aberta, porque é essencialmente indeterminada, desqualificada, além do conceito e, assim,
comparável ao espaço. Esta natureza indefinível é a abertura que nos faz
experienciar a mente como um “Eu” que possui as características que
habitualmente atribuímos a nós mesmos.
Mas devemos ter cuidado aqui! Dizer que a mente é aberta
como o espaço não é reduzi-la a algo não-existente, no sentido de ser
não-funcional. Como o espaço, a mente pura não pode ser localizada, mas é
onipresente e permeia tudo; ela abraça e permeia todas as coisas. Acima de
tudo, ela está além da mudança e sua natureza aberta é indescritível e
atemporal.
A claridade
Apesar da mente ser essencialmente vazia no sentido
explicado acima, ela não é apenas aberta ou vazia, porque se fosse, a mente
seria inerte e não iria experienciar ou conhecer qualquer coisa, nem sensações,
nem alegria ou sofrimento. A mente não é apenas vazia — ela possui uma segunda
qualidade essencial, que é a sua capacidade de experiências, de cognição. Esta
qualidade dinâmica é chamada de claridade. Ela é tanto a lucidez da
inteligência da mente quanto à luminosidade destas experiências.
Para melhorar nossa compreensão da claridade, podemos
comparar a abertura da mente ao espaço da sala onde estamos. Este espaço sem
forma permite que aconteçam nossas experiências; ele contém a experiência em
sua totalidade. É onde a nossa experiência toma o seu lugar. A claridade,
então, seria a luz que ilumina a sala e que nos permite reconhecer diferentes
coisas. Se houvesse apenas o inerte espaço vazio, não haveria possibilidade de
haver consciência. Isto é apenas um exemplo, porque a claridade da mente não é
como a luz comum do sol, da lua ou da eletricidade. É a claridade mente
que faz possível toda cognição e experiência.
A natureza aberta e luminosa da mente é o que chamamos de
“clara luz”; é uma claridade aberta que, no nível da mente pura, está
consciente em e por si mesma; é por isso que a chamamos de cognição
auto-luminosa ou claridade.
Não há um exemplo verdadeiramente adequado para ilustrar
esta claridade no nível puro, mas no nível comum, que podemos relatar mais
facilmente, podemos ter uma ideia de alguns de seus aspectos, ao compreender
uma das manifestações da mente — o estado do sonho. Vamos dizer que é uma noite
escura, e que nesta escuridão estamos sonhando, ou experienciando um mundo do
sonho. O espaço mental onde o sonho acontece, independente do lugar físico onde
estamos, poderia ser comparado à abertura da mente, enquanto sua capacidade de
experienciar, apesar da escuridão externa, corresponde à sua claridade. Esta
lucidez abarca todo conhecimento da mente e é a claridade inerente nestas
experiências. É também a lucidez do que ou quem as experiência; o conhecedor e
o conhecido, a lucidez e a claridade, nada mais são do que duas facetas da
mesma qualidade. A inteligência que experiência o sonho é a lucidez, e a
claridade presente em suas experiências é a sua luminosidade; mas no nível
não-dual da mente pura, é apenas uma e mesma qualidade, a “claridade”, chamada
de prabhasvara em sânscrito, ou de selwa em tibetano. Este exemplo pode ser
útil para o entendimento, mas tenha em mente que isto é apenas uma ilustração,
mostrando um nível manifestação particular da claridade em um nível habitual.
No exemplo, há uma diferença entre a lucidez o conhecedor e a luminosidade das
experiências do sujeito, porque o sonho é uma experiência dualista,
diferenciada em termos de sujeito e objeto, na qual a claridade se manifesta de
uma vez, na consciência ou lucidez do sujeito e na luminosidade de seus
objetos. De fato, o exemplo é limitado, pois fundamentalmente não há dualidade
nas mentes puras: é a mesma qualidade da claridade que é essencialmente
não-dual.
Sensitividade
Para uma descrição completa da mente pura, um terceiro
aspecto deve ser adicionado às duas primeiras qualidades já discutidas; é a
sensitividade, ou desimpedimento. A claridade da mente é a sua capacidade de
experienciar; tudo pode surgir na mente, então suas possibilidades de
consciência ou inteligência são ilimitadas. O termo tibetano que designa esta
qualidade literalmente significa “ausência de impedimento”. Esta é a liberdade
da mente experienciar sem obstrução. No nível puro, estas experiências têm as
qualidades da iluminação. No nível condicionado, elas são as percepções da
mente de cada coisa como sendo isto ou aquilo; ou seja, é a habilidade de
distinguir, perceber e conceber todas as coisas.
Voltando ao exemplo do sonho, a qualidade inerente de
sensitividade da mente seria, por causa de sua abertura e claridade, a sua
habilidade de experienciar a multiplicidade de aspectos do sonho, tanto as
percepções do sujeito sonhador quanto as experiências do mundo sonhado. A
claridade é o que permite surgir as experiências, enquanto a sensitividade é a
totalidade de todos os aspectos distintamente experienciados.
Esta sensitividade corresponde, no nível habitual e
dualista, a todos os tipos de pensamentos e emoções que surgem na mente e, no
nível puro da mente de um buddha, à sabedoria ou qualidades iluminadas
colocadas em prática para ajudar os seres.
Então, a mente pura pode ser compreendida assim: em
essência, é aberta; em natureza, é clara; e em todos os seus aspectos, é uma
sensitividade desimpedida.
Estas três facetas, a abertura, a claridade e a
sensitividade, não estão separadas, mas são concomitantes. Elas são as
qualidades simultâneas e complementares da mente desperta.
No nível puro, estas qualidades são o estado de buddha; no
nível impuro da ignorância e da ilusão, eles se tornam todos os estados da
consciência condicionada, todas as experiências do samsara. Mas não importa se
a mente é iluminada ou iludida, nada há além dela, e ela é essencialmente a
mesma em todos os seres, humanos ou não-humanos.
A natureza de buddha, com
todos os seus poderes e qualidades iluminadas, está presente em cada ser. Todas
as qualidades do buddha estão em nossas mentes, porém veladas e obscurecidas,
assim como uma vidraça é naturalmente transparente e translúcida, mas fica
opaca pela densa camada de sujeira.
A purificação, ou remoção destas impurezas, permite que
todas as qualidades iluminadas presentes na mente sejam reveladas. Realmente,
nossa mente tem pouca liberdade e poucas qualidades positivas porque ela é
condicionada pelo nosso karma, pelas marcas habituais do passado. Pouco a pouco, porém, as práticas do Dharma e de meditação
livram a mente e a desperta para todas as qualidades de um buddha.
Uma breve meditação
Neste ponto, provavelmente ajudaria fazer uma curta prática
experimental, uma meditação para tentar melhorar nossa compreensão sobre tudo
isso.
A PRATICA:
Sentando confortavelmente, vamos deixar a mente descansar em
seu estado natural. Relaxamos a nós mesmos, nossas tensões, e permanecemos sem
tensão, sem qualquer intenção em particular, sem artifícios… Soltamos nossa
mente e permitimos que ela fique aberta, como o espaço… Espaçosa, a mente
permanece clara e lúcida… Relaxada, solta, a mente permanece transparente e
luminosa… Não mantemos nossa mente encerrada em nós mesmos… Ela não está
confinada em nossa cabeça, em nosso corpo, no ambiente ou em qualquer lugar.
Relaxada, ela é vasta como o espaço que abarca tudo… Ela abarca tudo, todo o
mundo e todo o universo. Ela permeia nosso mundo inteiro. Permanecemos
descansados, relaxados, neste estado de abertura, ilimitado, totalmente lúcido
e transparente.
A abertura e a transparência da mente, similares ao espaço
infinito, são sinais do que temos chamado de abertura. Sua consciência livre e
clara é o que temos chamado de claridade.
Há também a sua sensitividade, que é a capacidade da mente
experienciar tudo em uma desimpedida consciência de pessoas, de lugares e de
todas as outras coisas. A mente pode conhecer todas estas coisas e pode
reconhecê-las distintamente.
Mais uma vez, sem orientar “a mente” — o sujeito-conhecedor
— para fora nem para dentro, permanecemos como estivermos, à vontade e
relaxados… Sem afundar num estado de indiferença ou estagnação mental, nossa
mente permanece alerta e vigilante…
Neste estado,a mente é aberta e
desengajada. Isto é a abertura… Na consciência lúcida está a sua claridade…
Todos os aspectos que conhece, distinta e desimpedidamente, são a sua
sensitividade.
Um obstáculo importante surge como resultado de
habitualmente confinarmos a mente ao corpo, que percebemos como sendo o nosso
corpo; nos identificamos com este corpo, nos fixamos nele e nos encerramos
nele. Para neutralizar isto, é importante relaxar toda tensão, toda
inquietação. Tensa e inquieta, a mente fica presa. Estas tensões terminarão
causando dores físicas e de cabeça.
Deixe a mente permanecer descansada em sua vastidão lúcida,
aberta e relaxada.
Podemos começar a meditar deste modo, mas é fundamental
continuar a prática sob a direção de um guia qualificado, que nos conduzirá no
caminho correto. Com a ajuda dele ou dela, podemos realizar a vacuidade da
mente, dos pensamentos e das emoções, o que é o melhor de todos os métodos de
nos livrarmos da ilusão e do sofrimento.
Reconhecer a natureza das emoções negativas permite que elas
sejam liberadas; é portanto essencial aprender a reconhecer sua vacuidade assim
que elas surgirem. Se permanecermos ignorantes de sua natureza vazia, elas nos
carregarão em sua torrente, nos escravizando e subjugando. Elas têm controle
sobre nós porque atribuímos a elas uma realidade que, na verdade, elas não têm.
Se realizarmos sua vacuidade, então o seu poder alienador e o sofrimento que
eles causam irão desaparecer.
Esta habilidade de reconhecer a natureza aberta e vazia da
mente e de todas as suas produções, projeções, pensamentos e emoções é a
panacéia, o remédio universal que, em e por si mesmo, cura toda ilusão, toda
emoção negativa e todo sofrimento.
Nossa mente pode ser comparada a uma mão que está atada ou
amarrada; neste caso, a mente está presa pela representação de nosso “eu”,
“ego” ou “self”, assim como pelos conceitos e fixações que pertencem a esta
ideia. Pouco a pouco, a prática do Dharma elimina estas fixações e conceitos
auto-estimadores e, assim como uma mão desatada pode se abrir, a mente se abre
e ganha todos os tipos de possibilidades de atividade. Ela então descobre
muitas qualidades e habilidades, como a mão livre de suas amarras. As qualidades
que são reveladas são aquelas da iluminação, da mente
pura.
Nenhum comentário:
Postar um comentário